O texto que vou indicar abaixo é de Fabríco Carpinejar. Amo a leveza da sua escrita , a sutileza com que ele trabalha as palavras e o poder que tem de equilibrar romantismo com a realidade.
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Serra da Piedade - Set/2012 |
Venha, por favor.
Eu espero alguém que não desista de mim mesmo
quando já não tem interesse. Espero alguém que não me torture com promessas de
envelhecer comigo, que realmente envelheça comigo. Espero alguém que se orgulhe
do que escrevo, que me faça ser mais amigo dos meus amigos e mais irmão dos meus
irmãos. Espero alguém que não tenha medo do escândalo, mas tenha medo da
indiferença. Espero alguém que ponha bilhetinhos dentro daqueles livros que vou
ler até o fim. Espero alguém que se arrependa rápido de suas grosserias e me
perdoe sem querer. Espero alguém que me avise que estou repetindo a roupa na
semana. Espero alguém que nunca abandone a conversa quando não sei mais falar.
Espero alguém que, nos jantares entre os amigos, dispute comigo para contar
primeiro como nos conhecemos. Espero alguém que goste de dirigir para nos
revezarmos em longas viagens. Espero alguém disposto a conferir se a porta está
fechada e o café desligado, se meu rosto está aborrecido ou esperançoso. Espero
alguém que prove que amar não é contrato, que o amor não termina com nossos
erros. Espero alguém que não se irrite com a minha ansiedade. Espero alguém que
possa criar toda uma linguagem cifrada para que ninguém nos recrimine. Espero
alguém que arrume ingressos de teatro de repente, que me sequestre ao cinema,
que cheire meu corpo suado como se ainda fosse perfume. Espero alguém que não
largue as mãos dadas nem para coçar o rosto. Espero alguém que me olhe
demoradamente quando estou distraído, que me telefone para narrar como foi seu
dia. Espero alguém que procure um espaço acolchoado em meu peito. Espero alguém
que minta que cozinha e só diga a verdade depois que comi. Espero alguém que
leia uma notícia, veja que haverá um show de minha banda predileta, e corra para
me adiantar por e-mail. Espero alguém que ame meus filhos como se estivesse
reencontrando minha infância e adolescência fora de mim. Espero alguém que fique
me chamando para dormir, que fique me chamando para despertar, que não precise
me chamar para amar. Espero alguém com uma vocação pela metade, uma frustração
antiga, um desejo de ser algo que não se cumpriu, uma melancolia discreta, para
nunca ser prepotente. Espero alguém que tenha uma risada tão bonita que terei
sempre vontade de ser engraçado. Espero alguém que comente sua dor com respeito
e ouça minha dor com interesse. Espero alguém que prepare minha festa de
aniversário em segredo e crie conspiração dos amigos para me ajudar. Espero
alguém que pinte o muro onde passo, que não se perturbe com o que as pessoas
pensam a nosso respeito. Espero alguém que vire cínico no desespero e doce na
tristeza. Espero alguém que curta o domingo em casa, acordar tarde e andar de
chinelos, e que me pergunte o tempo antes de olhar para as janelas. Espero
alguém que me ensine a me amar porque a separação apenas vem me ensinando a me
destruir. Espero alguém que tenha pressa de mim, eternidade de mim, que chegue
logo, que apareça hoje, que largue o casaco no sofá e não seja educado a ponto
de estendê-lo no cabide. Espero encontrar uma mulher que me torne novamente
necessário.