terça-feira, 4 de agosto de 2009

Minha Verdade Me Traiu - Fátima Cangussu


Está uma melancólica noite de inverno. Não consigo desvencilhar-me dos pensamentos que atormentam meus sonhos.
Alguns tempos atrás, conheci um escritor e iniciamos um mágico namoro literário. Aliás, somente eu o namorava, ele não tinha consciência do nosso caso. Estava tão absorto em seus escritos, que não percebeu que dos seus artigos me enamorava. Foi amor à primeira leitura.
Mas, estou percebendo que é um romance literalmente impossível, pois ele é um nobre escrevedor e eu apenas uma plebéia literária. Seus trabalhos demonstram sistematicamente o vasto conhecimento que possui. Estudioso de renomados autores, ele os disserta com competência e autoridade indiscutíveis. Ao mesmo tempo discorre sobre epsódios do cotidiano com habilidade e destreza. Escreve lindos poemas que tramitam entre os singelos e os audaciosos, sem contar os textos complexos e reflexivos. Bem, poderia ficar horas enumerando apaixonadamente seus predicativos literários, pois para tanto ele se preparou, estudou anos e anos a fio.
Nesta noite, estou me certificando que nosso relacionamento literário não tem um futuro promissor, pois sou insignificante diante de sua sapiência. Não pertenço ao mundo das letras, tampouco dediquei a estudar com afinco. É bem verdade que não tive grandes oportunidades, embora seja cômodo responsabilizar esse fato como tal. O pouco conhecimento que tenho não está fundamentado em nenhum teórico. Escrevo simplesmente pelo prazer de escrever, sem grandes pretensões, e para isto, conto apenas com minha sensibilidade. E para agravar o desgaste desta relação, estou com ciúmes literários dos seus escritos informativos, das análises literárias e dos poemas dedicados as paixões avassaladoras e amores perpetuados. Enfim todos os seus artigos, até mesmo aqueles que nos remetem a refletir sobre nós mesmos. Estou me tornando possessiva ao analisar os seus trabalhos e por mais que tente me libertar, não consigo ser imparcial nos meus julgamentos. Também estou lhe sufocando com tantas cobranças e exigências literárias.
Receio, que nosso episódio leterário, por minha culpa, aqui assumo, está em plena decadência e agoniza. Agoniza nas antíteses dos poemas desencontrados nos encantos e desencantos que criei. No brilho fosco da metáfora de uma poesia pobre. Tão pobre quanto as marcas deixadas no meu coração, das quais não tê-las,tanto, tanto lamentei. Nos complexos artigos, que jamais escreverei. Nos contos de relatos lacônicos, que fatidicamente apregoei. Na natureza pueril dos textos, que com certeza descreverei. Nas personificações retratadas das crônicas que relatei. Nas rimas que não consegui fazer acontecer, pois quem rima por prazer, é livre por querer...
Necessito, portanto,romper com nosso romance literalmente conflituoso, já que a minha tênue verdade me traiu.
13/08/2008